O mês de agosto
- paralereamar

- 9 de nov.
- 4 min de leitura
Um conto de Milena Pássaro
O mês era agosto — não era pelo fato de ser considerado o mês mais longo do ano, com seus intermináveis trinta e um dias. Tantos outros agostos haviam sido suportados por Melissa nos vinte e cinco anos vividos. Porém, algo naquele ano de dois mil e seis estava estranho. Um frequente cansaço e um sono sem fim tornavam ainda mais difícil o mês que homenageia o primeiro imperador romano, César Augusto.
As longas noites sem dormir e a fraqueza gerada pelo persistente cansaço já traziam maus resultados no trabalho. A falta de paciência, a irritabilidade e a baixa produtividade vinham chamando a atenção dos supervisores e atrapalhando a vida profissional da dedicada arquiteta. A semana não tinha sido fácil para ela e para o marido.
As luzes da casa apagavam e acendiam sem que ninguém tocasse o interruptor. A televisão ligava e desligava sozinha, assim como o volume do rádio aumentava e diminuía sem razão aparente. Por várias vezes, Melissa atendeu a chamados que, ao chegar ao portão, não encontrava ninguém. Apesar de algumas situações engraçadas divertirem o casal, a frequência desses fenômenos começava a causar preocupação e um certo medo, principalmente quando ela sentia o cheiro do cigarro do sogro.
Medo esse que fez o casal levar o colchão para a sala naquela noite de sexta-feira. As puxadas frequentes em uma das pernas de Melissa e a janela vibrando a todo momento, sem motivo algum, não os deixavam dormir. Fugir para a sala foi a maneira que encontraram de tentar ter uma noite tranquila de sono.
— Amor! Pegue a pedra.
Henrique dava risadas estendendo o lençol sobre o colchão. Para se ver livre dos cutucões noturnos, a esposa dormia com uma pedra no meio da testa. Superstição ou não, a garota só conseguia dormir com a labradorita sobre a cabeça e com o terço enrolado em uma das mãos.
— Vou tirar uma foto sua dormindo. É ridículo. Você vai acabar se machucando com essa pedra.
— Engraçadinho!
Henrique entregou a pedra à esposa e deitou-se. Melissa procurou uma música no YouTube, apagou as luzes e se aconchegou entre os braços do marido, buscando proteção. Antes que caíssem no sono, a luz da sala piscou algumas vezes. Olhando para cima, o rapaz se aproximou ainda mais da mulher.
Apesar da claridade que entrava pelas janelas de vidro, Melissa e Henrique dormiram até o meio-dia. Enfim, tiveram uma noite inteira de sono naquele tumultuado mês. O dia ficou registrado na memória dos dois — e não apenas pelo merecido descanso noturno. Não era vinte e dois de agosto, data da morte de Juscelino Kubitschek, nem vinte e quatro, quando Getúlio Vargas cometeu suicídio, muito menos vinte e cinco, o dia da renúncia de Jânio Quadros. Era vinte e nove de agosto: aniversário de uma das melhores amigas de Melissa — e mais um marco do estranho oitavo mês do ano.
Atrasados para o churrasco festivo, Henrique e Melissa chegaram levando bronca da aniversariante.
— Só duas horas atrasados!
— Desculpe! Fazia dias que não dormíamos direito. Apagamos.
No quintal, uma longa mesa reunia as amizades mais próximas. Da cozinha, pela janela, a mãe da aniversariante gritou:
— Melissa, vem cá me dar um abraço! Estou com saudades!
Durante toda a tarde, Melissa e as amigas ficaram grudadas, como acontecia sempre que se encontravam. Conversavam por olhares, e as gargalhadas só eram entendidas por elas — piadas internas que muitas vezes causavam desconforto nos menos íntimos.
No final da tarde, Henrique percebeu que Melissa estava quieta, já não se divertia como antes, e saiu de perto da churrasqueira desconfiado com um inesperado vento frio que passou pelo quintal.
— Está tudo bem?
— Estou tonta e toda arrepiada. Minha nuca está formigando, e parece que tem um monte de fiozinhos soltos no topo da cabeça.
Os pequenos degraus da cozinha se tornaram obstáculos para os pés da mãe da aniversariante que levou um susto ao voltar para a mesa. A bacia de salada rolou no chão, chamando a atenção dos convidados.
— Minha Nossa Senhora! — disse a mulher, passando as mãos pela testa.
Na cadeira, Melissa começou a tremer e a bater os dentes. As mãos suavam frias, e as amigas e o marido, assustados, não sabiam o que fazer.
Com os olhos arregalados, a moça debatia a cabeça, assustando ainda mais os que estavam à mesa.
— Rezem em voz alta a Prece de Cáritas e não parem até eu voltar. Você, venha comigo — disse a senhora com o pote de salada, levando Henrique pela mão.
Da cozinha, Henrique observava o desespero de Melissa. O medo, mais uma vez, tomava conta e a afastava da normalidade. Na churrasqueira, os rapazes, sem nada perceber, continuavam conversando sob o som alto que vinha do carro de um deles.
— Preste atenção em mim. Logo ela ficará bem. Seu pai está aqui. Ele está muito fraco e precisa de ajuda — por isso Melissa está passando mal. Ele agora está bem aqui, do seu lado.
Henrique ficou paralisado. O pai dele estava morto. Como poderia estar ali?
Ao lembrar dos fenômenos que vinham ocorrendo em sua casa, acreditou na aflita mulher.
— O que eu faço? Como posso ajudá-lo?
— Não sei. Não era para acontecer isso aqui, mas vamos tentar. Vamos voltar para a mesa e rezar todos juntos. A espiritualidade virá recolhê-lo e, assim, ele será ajudado. As sinceras súplicas da oração coletiva permitiram a intervenção divina. Dois homens vestidos de branco apareceram ao lado do pai de Henrique, que, emocionado, abraçou aqueles que vieram socorrê-lo.
O fraterno abraço e a expressão do fraco homem revelaram um laço de intimidade entre eles. Antes de atravessarem uma intensa e vibrante luz, Melissa pôde ver o sogro, com lágrimas nos olhos, despedir-se do amado filho, dizendo-lhe ao ouvido:
— Seu avô e seu tio vieram me buscar.




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