O pesadelo
- paralereamar

- 29 de out.
- 4 min de leitura
Um conto de Milena Pássaro
O Pesadelo
Na porta de casa, Melissa, sozinha e bem agasalhada, observava a íngreme e comprida rua escura. Os postes, com lâmpadas amarelas, proporcionavam uma fraca iluminação sobre o liso asfalto. O grande número de árvores deixava mais da metade da silenciosa rua no breu. O único som era o dos grilos.
A menina olhou fixamente para a parte mais alta da ladeira. O frio a fez esfregar uma mão na outra, e uma fina fumaça saía de sua boca.
A mente não compreendia o que os olhos registravam. Ela precisou prestar mais atenção no que via. Algo em movimento descia a rua. Era uma mulher.
Sim, era uma mulher — e uma mulher bem conhecida por ela. Não havia pés tocando o chão. Aquela imagem feminina simplesmente levitava sobre uma pequena nuvem que a conduzia ladeira abaixo.
Mais próxima, porém ainda distante, a mulher sorriu para Melissa. O sorriso trazia paz e alegria ao coração da garota.
— Minha mãezinha... minha Nossa Senhora!
No meio da rua, parada com as mãos unidas, Melissa olhou para o alto e quis correr ao encontro da mãe santíssima, que segurava um delicado rosário. Ela usava um manto azul-claro e uma dourada coroa sobre a cabeça. Antes de dar o primeiro passo em direção à aparição, uma nova imagem a paralisou.
Já no meio do quarteirão escuro, a mulher, ainda flutuando, mas agora em maior velocidade, teve o rosto e o corpo transformados. Pedaços de pele caíram ao chão, deixando à mostra uma carne esverdeada e enrugada. Os dentes escuros e deformados assustaram a menina, que, apavorada, assistiu à medonha velha soltar gargalhadas agudas.
— Minha Nossa Senhora!
Ofegante, Melissa abriu os olhos e sentou-se no meio da cama num brusco movimento. A pretinha gata de estimação, que dormia ao pé da cama, acordou e, miando, foi até ela.
— Não foi nada, Felina. Foi apenas um sonho ruim.
Com o coração ainda acelerado, ela ajeitou o travesseiro, puxou os pés para dentro do edredom e deitou abraçada à gata. Ao fechar os olhos, a imagem insistia em permanecer na mente da garota, que, desesperada, rezou uma Ave-Maria. Os cachorros da vizinhança latiam sem parar, mas antes de terminar o Pai-Nosso, ela adormeceu.
— Oi. Eu sei que está me vendo e sei que pode me ouvir.
Melissa se debatia na cama. A gatinha, antes tranquila entre seus braços, subiu no travesseiro e deitou apoiada à cabeça da dona. Os verdes e brilhantes olhos do animalzinho fitavam o canto da parede.
Melissa estava em seu quarto, mas ele estava diferente. Sem móveis. Ora claro, ora escuro.
— Você não vai me ouvir? Já faz três dias que venho aqui. Não vou conseguir mais. Você tem que me ouvir.
O corpo de Melissa gelou. Sob o edredom, ela se encolheu tentando se aquecer, mas, no sonho, estava de pé, em um canto do quarto, diante de uma senhora baixa, parada no canto oposto.
— Desculpe. Sei que te assustei, mas foi o único jeito de chamar sua atenção. Foi só um sonho. Eu não sou aquela velha horrível.
O quarto continuava vazio. A mulher falava normalmente, mas para Melissa, sua voz parecia ecoar pelas paredes.
— Olha pra mim. Você me conhece. Olha pra mim — disse, aproximando-se em questão de segundos da garota.
Com medo, frio e desorientada, Melissa olhou para o chão. Sobre o travesseiro, a gatinha se aproximava da cabeça da menina sempre que ela se debatia e deixava de tocá-la.
— Você já morreu... O que você quer? Me deixa em paz.
— Não vou te machucar. Preste atenção. Eu não tenho muito tempo.
Melissa continuou olhando para baixo, mas ouviu atentamente o que a aflita senhora dizia.
— Diga a ela que não precisa chorar mais. Eu sempre estarei por perto. A vida tem que continuar, e eu não quero ver a tristeza dominar minha filha. Você fala?
— Ela não vai acreditar.
— Vai sim! — gritou a senhora, furiosa.
A janela e a porta vibraram. Com medo e ainda olhando para o chão, Melissa balançou a cabeça afirmando que sim — e acordou assustada novamente. Os olhos estavam marejados.
Ela retirou a gata de sobre a cabeça, acendeu a luz e viu que estava tudo no lugar. Estava em seu quarto. Ajeitou-se na cama e adormeceu com as luzes acesas.
— Acorda, filha, você está atrasada!
Sonolenta, a caminho da escola, Melissa esbarrou em um vizinho que abriu o portão de supetão. Ficou alguns segundos parada, olhando para o rapaz.
— Anda, fala pra ele — a voz da senhora ecoou, como se estivesse ali, ao lado dos dois.
Melissa hesitou, mas contou ao rapaz o que havia acontecido durante a noite. Perplexo, ele voltou para dentro de casa e sentou-se ao lado da irmã, que chorava à mesa do café da manhã.
Melissa, segurando as alças da mochila, viu, pelo portão, a pequena senhora ao lado dos filhos, que, olhando para ela, disse agradecida:
— Muito obrigada, querida.

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